Autoras:
Me Fernanda de Godoy Grecca (Mestre em Ciências pela Universidade de São Paulo, especialista em AAS e ICP -OES com mais de 10 anos de experiência em preparo de amostras das mais diversas matrizes e posterior análise de metais pelas técnicas mencionadas. Com conhecimento de legislações ambientais, farmacopeias e ISO 17025).
e
Dra. Glaucia Maria F. Pinto
O que são impurezas elementares?
Basicamente, são metais que podem estar presentes no Insumo Farmacêutico Ativo (IFA) ou no Produto Acabado, devido o uso de catalisadores metálicos, contaminações devido a interações com equipamentos e utensílios de manipulação, podem ser contaminações ambientais e oriundos de outras fontes durante as sínteses do IFA, dos excipientes ou o processo de produção do produto em si.
A segurança na fabricação de produtos farmacêuticos é uma questão de saúde pública de extrema importância. Neste sentido, o controle das impurezas elementares é essencial, de forma que o medicamento produzido seja seguro para o consumo.
A United State Pharmacopeia (USP) que é uma grande referência em métodos para análises na indústria farmacêutica, em seu capítulo 233 (Método Geral <233>), recomenda o uso de ICP-OES e ICP-MS para as análises de impurezas elementares. O capítulo 232 (Método Geral <232>) por sua vez aborda os limites permitidos dessas impurezas nos medicamentos (Figura 1: resumo).

O guia internacional ICH Q3D também recomenda o controle dessas impurezas devido a sua elevada toxicidade. Esse guia divide esses elementos em 3 classes de acordo com a sua toxicidade e a dose de exposição diária permitida (PDE), conforme mostrado na Tabela 1 abaixo:

É importante ressaltar também que outros elementos como: Al, Ca, Fe, K, Mg, Mn, Na e Zn, os quais o PDE não foi estabelecido ou que possuem baixa toxicidade inerente, também podem ser monitorados por representarem risco ao organismo humano em concentrações elevadas.
O ICP-OES (Espectrometria de Emissão Óptica com Plasma Indutivamente Acoplado) e o ICP-MS (Espectrometria de Massas com Plasma Indutivamente Acoplado) são duas técnicas analíticas para a determinação de metais que permitem a detecção simultânea de vários elementos com limites de detecção e quantificação bastante baixos, atingindo até a ordem de “partes por trilhão” (ppt – caso do ICP-MS).
O que diferencia as duas técnicas é a forma como o sinal analítico é gerado em cada uma: no ICP-OES ocorre uma propagação da radiação e no ICP-MS os íons gerados devem ser transferidos para o espectrômetro de massas.
Alguns exemplos de ICP-OES e ICP-MS disponíveis no mercado estão ilustrados na Figura 2 abaixo:

Por possibilitarem a análise multi-elementar desses elementos citados pela USP e pelo ICH Q3D, com limites de detecção muito baixos, o ICP-OES e o ICP-MS são técnicas altamente relevantes para os profissionais da indústria farmacêutica.
Uma técnica alternativa, como a Espectroscopia de Absorção Atômica com Chama (FAAS), pode ser usada somente se o método tiver sido validado e atender a critérios de aceitação recomendados. A FAAS pode ser apropriada para caracterizar poucos elementos presentes em concentrações maiores em matérias primas. Porém, é improvável atender a necessidade de análise de produtos acabados, nos quais os níveis de concentração são muito menores e é desejável melhor exatidão.
Comparação entre ICP-OES e ICP-MS
Alguns pontos importantes a serem discutidos no comparativo entre as técnicas de ICP-OES e ICP-MS:
- Limites de detecção:
ICP-MS tem LD ao redor de 3 ordens de grandeza menores que os limites encontrados para ICP-OES, para a maioria dos elementos. Essa diferença em geral é causada pelo fato do ICP-MS ser mais tolerante a interferências causadas pela matriz, do que o ICP-OES, que necessita de diluições maiores da amostra. O LD do ICP-OES pode ser útil para analisar matérias primas e para produtos farmacêuticos de via oral nos quais os limites de PDE são maiores.
Já o ICP-MS atinge limites de detecção da ordem de partes por trilhão para todos os elementos que devem ser monitorados. Esses limites permitem ainda atingir exatidão nas determinações incluindo várias formas farmacêuticas, como parenterais ou drogas de inalação, que tem níveis de PDE menores do que os exigidos para medicamentos de via oral. Assim, o ICP-MS oferece flexibilidade para atingir os limites requeridos na regulamentação, para todos os elementos e para todos os tipos de amostras.
- Diluição
Os níveis de diluição aplicados durante o preparo de amostra devem ser considerados no comparativo. Se uma pequena quantidade de amostra está disponível, uma diluição maior será necessária para alcançar o volume de amostra para análise e, neste caso, o ICP-MS requer maiores diluições por ser mais sensível á sólidos dissolvidos. O uso de diluições maiores reduz a concentração alvo (valor J) na solução e então valores de LD menores são requeridos para permitir a análise. Similarmente, amostras que contem alto nível de sólidos dissolvidos devem ser diluídas antes da análise e o ICP-MS, por ser mais sensível a sólidos, irá requerer maior diluição do que o ICP-OES (o equipamento ICP-OES 5800 Agilent pode medir amostras com até 25% de sólidos em suspensão, enquanto o ICP-MS tolera ao redor de 0,2% de sólidos – sem o sistema com Ultra High Matrix Introduction (UHMI), que melhora em quase 100 x a tolerância).
De qualquer forma, os menores LD do ICP-MS garantem maior flexibilidade na escolha do nível de diluição apropriado para procedimentos de preparo de amostra.
- Especiação
Muitos limites de toxicidade são dependentes da especiação (estado de oxidação do elemento e complexação na forma de organometálicos). A análise de especiação requer o acoplamento da cromatografia líquida com o ICP-MS.
A Figura 3 apresenta um sistema de LC integrado com ICP-MS para permitir a análise de especiação de impurezas elementares.


- Rapidez da análise
ICP-OES é uma técnica de análise rápida, permitindo a análise de aproximadamente 2x mais amostras do que o ICP-MS (em 24h o ICP-OES pode medir 2500 amostras, comparado com 1200 amostras no ICP-MS). Assim, laboratórios com alta demanda de amostras de dose oral e com menores fatores de diluição podem se beneficiar do uso de ICP-OES.
- Custo e facilidade de operação
Os instrumentos de ICP-OES representam menor investimento (menor custo) para aquisição e para manutenção quando comparados com ICP-MS. Há, geralmente, poucas variáveis operacionais para setup no ICP-OES e analistas tem maior familiaridade com as opções disponíveis. Entretanto, equipamentos mais modernos de ICP-MS já estão sendo configurados por seus fornecedores com métodos e rotinas automatizadas, simplificação de workflows e assim permitem boas performances mesmo com analistas menos experientes, o que reduz o tempo de treinamento necessário também.
Preparo da amostra e limites de detecção alcançados com ICP-MS: exemplos
Tem sido demonstrado que a dissolução direta em meio aquoso é uma opção interessante de preparo de amostra farmacêuticas solúveis em agua, para posterior análise de acordo com método USP <233> usando ICP-MS.
Dissolução indireta via vaso fechado com digestão por micro-ondas, entretanto, é reconhecida como o preparo de amostra mais abrangente, compatível com diferentes amostras e subsequente análise por ICP-MS. Uma vantagem importante do vaso fechado e digestão por micro-ondas é a retenção de elementos voláteis, em particular o mercúrio, que em outras formas de preparo de amostra poderia ser perdido.
Em um exemplo de aplicação descrito pela Thermofisher (APPLICATION NOTE 43325), ácidos fortes, como sulfúrico e nítrico foram adicionados à amostras em vials de vidro e os mesmos foram transferidos para o sistema de digestão de micro-ondas, sendo os vials fechados, pressurizados com nitrogênio a 40 bar e foram aquecidos seguindo um programa de temperatura (conforme Tabela 2). Digestões a altas pressões são recomendadas por permitirem utilizar baixas temperaturas e assim minimizar a perda de elementos voláteis.

Após resfriarem, as amostras foram transferidas para vials de polipropileno e soluções aquosas ácidas tiveram suas concentrações ajustadas. Usando curvas de calibração externa, os elementos descritos na Tabela 3 foram analisados, tendo como referência os valores de PDE e os respectivos limites alvo (J) calculados, de acordo com a equação abaixo:


A Tabela 4 descreve os limites de detecção obtidos utilizando o método descrito, podendo-se notar que são bem menores que os limites alvo J necessários de serem monitorados.

A Tabela 5 ilustra outros valores de limites de detecção, comparados com valores alvo J descritos para os elementos Cd, Pb, As e Hg reportados na nota de aplicação 5991-8149EN da Agilent (2021).

Na Tabela 5 também se observa valores bem inferiores aos limites necessários, comprovando a alta qualidade e perfeito atendimento as regulamentações permitidos com a técnica de ICP-MS.
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